terça-feira, 11 de março de 2008

Máscaras...más caras.




A um tempo atrás ilustrei a revista Vitreo distribuida na Facamp e concedi uma entrevista.

Seguem algumas das perguntas e suas respectivas respostas, espero que gostem.


O que te faz designer?

A possibilidade de traduzir o desejo em algo palpável, ou visível aos olhos de todos, é como se eu pudesse dividir uma visão particular que tenho do mundo, mostrando como enxergo de forma distinta dos demais um mesmo ponto, objeto, ou situação, seria como mostrar através da capacidade de interpretação que minha bagagem emocional e cultural traz, e me dão uma visão distinta da dos demais, seria maravilhoso poder ter acesso a forma como todos interpretam algo que tem em vista em um momento comum, mas como isso não é possível, acho que a minha personalidade de traço, como indivíduo mesmo, pode ser explicitada aos demais através disso, isso me faz designer, “desenhador”, tradutor de idéias, mais um entre tantos querendo ser relevante e útil para o mundo.

Em que você se inspira para suas ilustrações?

Minha inspiração vem de experiências que vivencio, assim como de referências que estão ligadas a diversos ilustradores que admiro e acompanho, através de livros e das facilidades que a internet nos propicia, e a tudo que engloba a ilustração propriamente dita. Também acompanho muito street art, e assiduamente sua principal vertente, que é o graffiti, não o graffiti ligado ao movimento do Hip-Hop. É óbvio que o graffiti nasceu nesse movimento, mas hoje aderiu a experimentações que seguem uma linha muito mais artística, com embasamento em mestres e estilos marcantes, e ultimamente, as diferentes plataformas que são adotadas para a execução de uma obra de arte, que foge das telas de pintura e partem pra formas mais irreverentes, e porque não comerciais, utilizando brinquedos conhecidos como art toys, desenvolvidos por estes artistas, decks de skate, até em tênis adotados pela cultura sneakerhead, aqueles carregados de nostalgia das décadas de 70, 80 e 90 principalmente, sou um pouco saudosista e respeito muito essa cultura, me inspiro ou procuro através deles encontrar no meu traço e nas cores que “adoto” um estilo que tenha personalidade própria, a minha identidade, e ainda estou na busca por essa síntese para que a mensagem seja algo que dê alma para o desenho e faça com que isso seja sentido por quem vê.

O que pretende fazer quando se formar?

Bom, não sei dizer ao certo o que pretendo fazer hoje, não por ter opções escassas, mas muito pelo contrário, quando comecei a me aprofundar nas customizações que certos ilustradores, grafiteiros e designers passaram a adotar, notei a infinidade de plataformas com as quais eu como ilustrador e futuro “designer” entre aspas, pra não ficar redundante, poderia atuar, comecei a ver o leque imenso de possibilidades que essa profissão traria, quando vim para a Facamp por influência de um grande amigo, queria muito trabalhar com a área de estamparia de moda, queria ser parte integrante da programação visual da marca Cavalera, tenho uma história um pouco longa que explica o porquê disso, mas ao longo do curso fui experimentando novas técnicas e procurando encontrar um estilo que fosse marcante, e essa procura ainda não terminou, e acho que nós todos temos a busca de inovar, almejamos isso ao menos, mas pretendo atuar em diversas áreas que o Design abrange, porque faço isso com paixão e certa teimosia.

Qual o seu processo de criação?

Primeiro, procuro ver o que quero passar através do meu desenho, às vezes pode ter um caráter crítico, um toque de humor, entre outras possibilidades, mas o que faço, é observar a minha volta, é um tanto vago, mas procuro detalhes que chamem a minha atenção, situações, e mesmo noticias que me prendam o olhar em algum momento, depois, procuro passar para o papel, um esboço rápido, com diversos elementos que poderiam compor a arte final, na maioria das vezes trabalho com vetor, ultimamente mais, à mão livre, a linha tem muito mais personalidade, é uma coisa muito pessoal, mas observo também o trabalho de outros artistas com freqüência, para ter um bom repertório visual, mas quando estou criando procuro me apropriar apenas do que guardo na memória, porque as coisas se misturam e quando o desenho sai, vira um misto de referências com um resultado que muitas vezes pode ter algo de original e pessoal, procuro isso incessantemente, acho que pra definir o meu processo de criação posso citar um trabalho que desenvolvi para o concurso da marca Volcom. O Briefing do concurso pedia ilustrações, que pudessem servir como estampas de uma futura coleção. Não existia um número limite de artes a serem mandadas, por isso resolvi criar três artes distintas, inicialmente, anotei todas as idéias, escrevendo uma lista de possíveis artes, tudo que vinha na minha cabeça eu anotava, acho que depois de depurar tudo cheguei a umas 15 estampas, 15 caminhos que poderiam ser seguidos, destas 15, finalmente me decidi por três, uma arte, que foi inspirada em um quadro do pintor surrealista René Magritte, a segunda em um estilo de ilustração adotado nos anos 80 para compor desenhos para shapes de skate, um estilo que remetia a lowbrow art e a terceira, era a arte que englobava meu conceito, queria passar uma idéia de coisa recém preparada, como uma sacada rápida que chegasse com a mesma velocidade ao consumidor, por isso resolvi colocar minhas artes em uma marmita, a marmita comum descartável de alumínio, que é algo que ao mesmo tempo é popular e abrange a realidade de muitas classes sociais, é prática, rápida e chega fresca e quentinha, como uma boa idéia, acredito que a arte é de certa forma o alimento da alma, (“tô” profundo hoje), achei bem plausível colocar minhas artes na marmita e desenvolver um conceito “delivery” pra elas. Enrolei as impressões como guardanapos com selos da marca e coloquei-as dispostas uma do lado da outra, fechando a marmita fiz uma montagem fotográfica de uma macarronada, com o símbolo da marca desenhado em molho de tomate, e por cima dessa arte da macarronada uma tampa simulando o “delivery” de uma cantina italiana com a frase: “Mangia che te fa bene!”, entre artes de todo o Brasil, a minha “marmita” foi considerada como a plataforma mais inusitada, ganhei um prêmio pela inovação da embalagem e isso foi muito gratificante e me deu ânimo pra que continuasse criando esse tipo de apresentação diferenciada, apesar de que a execução da estampa em uma camiseta era quase impossível pela complexidade de representar aquilo em silk-screen comum, mas o reconhecimento foi bem legal. Ficou coerente apesar de nonsense.

Se não fosse designer, seria o quê?

Eu nunca pensei nisso, pois desde que me lembre, desde que me conheço por gente eu desenho, tenho pena dos meus pais que tinham que ouvir nas reuniões do colégio que nas aulas eu só desenhava, era disperso e ficava fazendo meus desenhos nas apostilas, sou assim até hoje, não posso evitar, apesar de por muitas vezes, pagar o preço desse meu perfeccionismo com as entregas que acabo não terminando, fiquei feliz outro dia, ao ler uma entrevista dos irmãos Gustavo e Otávio Pandolfo, também conhecidos internacionalmente como os grafiteiros OsGêmeos (assim mesmo “tudojunto”) que, na minha visão leiga e deturpada de jovem universitário, são dois dos poucos gênios contemporâneos no campo das artes visuais, quem conferiu a exposição deles na Galeria Fortes Vilaça deve concordar comigo, (balancem a cabeça afirmativamente ok?) Mas enfim, li que eles padeciam desse mesmo mal, a dispersão em função de desenhar e desenhar, esse mundo da lua que nós vivemos pode trazer experiências lúdicas repletas de significados para muitos, acho que se eu não fosse o que sou, esse pseudo-designer sonhador, seria ligado a outro meio de expressar os sentimentos, acho que o grande lance é tocar a alma das pessoas de alguma forma, pode ser a pessoa mais humilde, ou a mais erudita, se consigo gerar nela uma emoção através de um desenho, por menor que seja, já posso dizer que seria a realização plena, mas quem sou eu com tanta pretensão não?

Fale um pouco sobre a ilustração que fez pra Vítreo.

Eu quis criar algo que ao mesmo tempo contaria com um pouco de crítica, e uma visão particular de como se encaram alguns dos problemas cotidianos, não sei se vou conseguir mostrar exatamente isso, minha ilustração tem elementos que remetem a um universo paralelo, com elementos bizarros, mas nesse universo, as personagens se escondem ainda atrás de suas máscaras, elas tendem a imitar a aparência umas das outras para se sentirem seguras, mas mesmo assim ainda temem o julgamento, por isso aparecem escondidas, todos julgam e são julgados diariamente, passamos por provas para tudo, sempre precisamos mostrar algum resultado pra alguém, quando acreditamos nisso, a meta ou a vontade de atingir uma posição ou aceitação em determinado grupo, eu acredito que isso é algo que não tem como ser separado do atual padrão de como nossa sociedade se organiza, é tudo vago e ao mesmo tempo está ai pra ser visto, mas camuflamos os nossos problemas criando uma barreira, é uma critica, mas tem sua representação em personagens que não são nada repulsivos, seria um pré-conceito, acho que cada um deva dar a sua interpretação a essa ilustração, é um exemplo de que ainda tenho muito que aprender, obrigado pela oportunidade!

Thiago Luporini

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